Capítulo 4- Nicole

Esta é a única foto de família que nos resta e eu conheço cada detalhe como a palma da minha mão. Sei, por exemplo, que atrás da foto, na caligrafia do meu pai, está a palavra, Paz, que é o nome da minha mãe. Paz. Um coração está desenhado sobre isso. Mesmo nesta foto, minha mãe está usando seu colar de pomba característico. A pomba significa paz, não é?

Enquanto olho para a foto, ainda estou usando o colar. Nunca o tirei desde que ela me deu, antes daquela noite fatídica. O colar me faz sentir próxima da minha mãe.

Viro-me da foto e ligo a TV de plasma. Logo depois, subo as escadas e deixo a água correr para tomar um banho. Os sons da TV chegam até mim quando reapareço do corredor.

Assisto ao noticiário por um tempo e depois subo, tomo meu banho e desligo a TV. Vou para o meu quarto, pego meu laptop e termino um relatório que envio para o chefe de reportagem da minha estação. Penso em fazer mais algumas edições na matéria, mas me convenço a não fazer. Vai voltar com muitas correções de qualquer maneira... "remova isso, parece difamatório," "insira a fonte aqui," "delete isso."

A matéria pode ser rejeitada também. Há várias coisas acontecendo todos os dias; só coisas realmente espetaculares chegam ao noticiário de qualquer forma. Porque as pessoas querem ouvir sobre coisas dramáticas, não sobre o chato, o desinteressante e o mundano. A seleção de notícias só deixa o público receber o que realmente quer. Mas isso só me irrita porque às vezes apenas três matérias das sete que envio chegam ao corte final e aparecem no noticiário da noite.

Eu realmente amo meu trabalho, apesar de todo o estresse. Acabei de ser adicionada ao departamento de reportagem e, embora isso tenha me desgastado, sempre estive procurando mais responsabilidade; maneiras de crescer na indústria.

Desligo meu laptop e vou dormir. O sono me envolve assim que deito na cama.


Meus olhos se abrem lentamente.

Não consigo voltar a dormir. Também não consigo me levantar. O medo me mantém no lugar; me paralisa. Ouço a porta da frente fechar. Ou abrir.

E é precisamente porque não sei qual das duas, que o medo mantém seu domínio sobre mim. O intruso já entrou e saiu ou minha casa está sendo invadida agora?

Fico imóvel na cama por alguns minutos enquanto escuto. Consigo ouvir passos, pesados, e não sei o que fazer. Eles parecem se aproximar e depois se afastar ou minha mente deve estar pregando peças em mim.

Não é o José. José tem sua própria chave, sim, mas ele geralmente bate quando sabe que estou em casa. E ele disse que voltaria amanhã. Certamente não estaria andando pela casa sem me avisar. A menos que ele queira me dar um susto, claro.

Sou uma covarde. Sei dentro de mim que ninguém tem o direito de andar pela minha casa como se fosse dono do lugar enquanto estou na cama, inútil e incapaz de fazer algo, mas ainda assim fico na cama, esperando que eles simplesmente vão embora, meus olhos o tempo todo fixos na primeira gaveta da mesa ao lado da minha cama. Há um pequeno punhal lá. José me fez guardá-lo ali para que eu pudesse me proteger em momentos como este.

Então, por que diabos ainda estou deitada na cama esperando que qualquer força sinistra além da porta do meu quarto faça o que quiser comigo? Não faz muito sentido morrer tão facilmente, sem me dar uma chance de lutar. Parece mais sensato levar a luta ao intruso. Surpreendê-lo. Eles são os invasores. Esta é a minha casa.

Lentamente, levanto-me e deslizo para fora das cobertas e abro a gaveta. Quando sinto a lâmina fria do punhal na minha mão, solto um suspiro suave, tentando acalmar minha respiração.

Caminho na ponta dos pés pelo meu quarto. Não sei por que não consigo ser mais silenciosa enquanto me dirijo à porta. Minha respiração soa muito alta nos meus ouvidos. O farfalhar das minhas roupas enquanto me movo é quase ensurdecedor.

Engulo um suspiro profundo e empurro a porta do meu quarto. A porta desliza com um rangido distinto e isso me assusta. Parece muito alto. O intruso será atraído por esse barulho, mais preparado agora, sabendo que estou vindo e que estou neste quarto?

Tento manter o foco na tarefa em mãos. O silêncio me cumprimenta enquanto olho pelo corredor. Silenciosamente, verifico todos os quartos, um por um, começando pelo de José, meus ouvidos atentos para captar qualquer ruído. Só preciso de um - apenas um - estrondo de porta para ter um colapso mental neste ponto.

Depois de terminar com os quartos no andar de cima, desço as escadas, segurando meu punhal na mão como uma espada, com os dedos envoltos ao redor dele. Procuro na sala de estar, na cozinha e no armário do hall de entrada. Não há ninguém lá. E as portas e janelas estão trancadas. Ainda trancadas. Sei que as tranquei antes de ir para a cama ontem.

Vou até a cozinha e me sirvo de um copo do uísque do meu irmão. É bem cedo - por volta da meia-noite - mas eu preciso disso. Aquela sensação... É algo completamente diferente de tudo que já experimentei. Alguém esteve aqui. Ou algumas pessoas.

Ainda assim, as portas estão trancadas. Preciso falar com José sobre trocar as fechaduras das portas assim que ele chegar hoje.

Saio da cozinha e vou até a porta da frente. Uma vez lá, espreito pela janela ao lado da porta. Não há atividade na rua. Está muito quieto. Há um carro estacionado do outro lado da rua. É um Ford preto e não sei há quanto tempo está estacionado ali. Não sei se estava lá desde que cheguei do restaurante.

Verificando as portas uma última vez, subo de volta com o punhal e tento dormir um pouco.

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