Parte 4
Allie fechou os olhos com força, pensando no que Nate disse mais cedo. Não só isso, mas também como seu cheiro era neutro. Claro que era. Afinal, ela é uma ômega se passando por uma beta. Ela não conseguia deixar de lembrar como tudo aconteceu.
"Descobri algo," disse o médico da alcateia. Ele enfiou a mão no bolso de sua jaqueta rasgada e puxou um frasco branco, as palavras borradas por serem escritas em letras minúsculas. Allie apertou os olhos, tentando entender.
"Isso vai te ajudar. Dentro deste frasco há uma pílula que pode alterar seu cheiro. Dura apenas um mês, então você precisa se certificar de tomá-la todo mês."
A ômega olhou para o frasco e o aceitou de bom grado. Que outra escolha ela tinha? Era isso ou dizer adeus ao seu sonho de vida. Já haviam tirado muito dela, então Allie não estava pronta para sacrificar seu sonho também. Nervosamente, ela destampou o frasco e espiou dentro. O frasco estava cheio de pílulas azuis em forma de gel, e elas tinham um cheiro forte e neutro. Quase lembrava os guardas do lado de fora da casa da alcateia.
"Qual a diferença entre essas e os supressores?" Ela perguntou enquanto fechava a tampa com força.
O médico da alcateia enxugou o suor da testa e apontou para o frasco. "Os supressores escondem seu cheiro; essas pílulas o manipulam. Você é uma ômega pura, seu cheiro é intoxicante para os outros, especialmente para os Alfas Puros. Eles também podem ser raros, mas são possivelmente perigosos."
Ela levantou as sobrancelhas para o frasco e fez um som. Nada a fazia se sentir mais inferior do que a lembrança de que há alguém lá fora—mais potente e poderoso do que sua espécie e que está interessado em possuí-la.
"Obrigada pelo lembrete, doutor."
Ele suspirou. "Estou tentando te ajudar aqui, Allie. Não há outra maneira. Como eu disse, seu cheiro é de uma ômega pura, mas e se houvesse uma maneira de mudar seu cheiro, para que você fosse... mais segura? E se você cheirasse como uma beta? Ninguém mira em uma beta."
A ômega ficou quieta enquanto pensava nisso. Ela franziu a testa antes de olhar entre o homem mais velho e o frasco em suas mãos. Quanto mais pensava, mais percebia que era a única maneira. "Você acha que vai funcionar?"
"Sim," o médico da alcateia respondeu rapidamente. "Eu não achava que funcionaria, mas veja, funciona. Eu estava fora tarde da noite, procurando mais ervas para experimentar quando tropecei em algo. Eu não conseguia sentir cheiro de nada. Então me virei e vi algo que nunca pensei que veria na vida. Um Cão Infernal Alfa morto. O que pode matar uma dessas coisas?"
Sua boca se abriu com isso. O que poderia tê-los matado? Apenas uma alcateia forte o suficiente poderia derrubar um Alfa assim.
"Um Alfa morto sem cheiro?"
"Foi o que eu pensei! Essas criaturas fedem por onde passam. Cães Infernais têm glândulas de cheiro sob a pele, certo? Aquele cara morto estava escondendo seu cheiro."
"Ele tinha essas pílulas?"
"Com certeza!" exclamou o médico. "Eu as encontrei na bolsa dele. Os ingredientes para fazer essas pílulas e não, este frasco é apenas um dos três que eu consegui. Eu queria dar para você."
"Você conseguiu três frascos do Cão Infernal morto?" Allie gritou.
"Eu sei que não soa bem quando você diz em voz alta. Mas não temos mais opções" O médico esfregou o rosto. "Seu irmão... Deixa pra lá. Eu também as experimentei. Tomei uma, e em duas horas, senti que poderia correr quilômetros, mais do que quando tinha sua idade. Foi como respirar ar fresco."
Ela examinou o frasco e pensou em todas as possibilidades que essas pílulas poderiam lhe dar. Com elas, Allie poderia esconder seu cheiro puro e se aventurar mais sem medo. Os supressores que ela tomava mal eram fortes o suficiente para conter como a ômega cheirava para os outros, mas talvez essas fossem mais fortes. "Ninguém suspeitou de você?"
O médico da alcateia balançou a cabeça, sua barba balançando junto. "Eu fui até os Alfas estranhos, e deixe-me te dizer; eles são os que te fazem se borrar de medo só com um olhar. O dobro do meu tamanho. Mas eu tinha essas pílulas para me fazer um Alfa, e eles nem piscaram com meu cheiro. Apenas apontaram, perguntaram o que eu estava fazendo fora da fronteira, e eu inventei uma história e saí. As pílulas funcionaram, eu te digo."
Allie ficou maravilhada com a história, seus olhos arregalados e a boca ligeiramente aberta de admiração. E foi assim que ela começou a tomar aquelas pílulas nos últimos seis meses.
Na manhã seguinte, Allie soltou um suspiro suave. Ela levantou a cabeça, olhando para o céu enquanto o sol ainda não havia nascido completamente, o ar leitoso na frente de sua boca se transformando em névoa a cada vez que exalava. A ômega segurou o tornozelo e alongou a parte da frente da coxa, trocando de perna duas vezes antes de se abaixar para tocar os dedos dos pés. Era sua rotina de alongamento antes de começar a correr.
Nesse momento, ela ouviu um assobio alto vindo de trás.
"Essa é a vista que eu gostaria de acordar todas as manhãs."
Seu corpo relaxado se transformou em um feixe tenso de músculos e ossos. A ômega olhou para trás através do espaço entre seus tornozelos apenas para encontrar o cão infernal. Nate.
Ele correu em sua direção. Suas longas pernas faziam com que sua passada fosse sem esforço. Com uma camiseta vinho e uma calça de corrida preta apertada, ele sorriu presunçosamente para ela. Um boné preto empurrava seus cachos para baixo até o pescoço.
Allie lentamente se endireitou e virou-se para encontrar seus olhos. Como ele conseguiu rastreá-la? Ao contrário dos outros, a ômega usava o outro lado do campo, o mais próximo da floresta escura, para correr.
"O que você está fazendo aqui?" Ela rosnou.
"Essa vista é tão legal!"
Ela cruzou os braços contra o peito. "Sinto que estamos falando línguas diferentes agora."
"De qualquer forma," ele arrastou as palavras, mexendo no bolso da calça de corrida. O Alfa voltou a focar nela e sorriu, passando a mão na borda dos cachos. "Tem uma festa na nossa fraternidade na sexta-feira. Temos os melhores escorregadores de gelo. Você pode se juntar a nós."
"Essa é sua maneira de se desculpar?"
"Não. Só estou aqui para te convidar para uma festa."
Allie zombou disso. Não havia como ela se aproximar dele ou daquela fraternidade. Além disso, o comentário dele sobre sua mãe ainda doía. "Eu não vou a festas, obrigada."
"Pense nisso! Você não sabe o que está perdendo."
"E eu não me importo." Com isso, ela se afastou dele.
"Então, você corre todas as manhãs no mesmo horário?"
Na manhã seguinte, Nate passou pelos tênis dela jogados no chão. Um arrepio percorreu sua espinha. "Só estou perguntando para que eu possa planejar meu horário entre o futebol e as aulas."
Allie não se dignou a responder. Em vez disso, colocou os fones de ouvido e começou a correr em direção ao seu destino. Os músculos dela se contraíam e flexionavam sob os shorts de corrida pêssego, que terminavam no meio da coxa.
Nate correu atrás dela, carregando os tênis dela. "Ei, você perdeu seus sapatos."
Sua passada acelerou. Os pulmões ardiam a cada respiração que ela dava, o vento chicoteando suas mechas soltas, mas ela não se virou.
O Alfa Hellhound ofegava e forçava suas pernas a trabalharem mais rápido. "Você ouviu uma palavra do que eu disse?"
As solas dos pés descalços dela voaram pelo caminho antes de ela virar uma esquina.
"Espere por mim!" A voz dele flutuou pela poeira; ela já estava a quilômetros de distância.
"Eu vou te alcançar," Nate gritou novamente, suas palavras visivelmente se condensando no ar frio. "Eu estarei bem aí. Um minuto!"
Allie escondeu o sorriso, mas não respondeu.
Mais uma vez, ela teve que enfrentar Nate. Ele chegou ao local de corrida dela às cinco para as cinco—cinco para as cinco da manhã—e fez um gesto de vitória com o punho. Como se soubesse que ninguém estava assistindo. Allie o observou por alguns segundos, notando a maneira como ele girava pelo campo. Ele olhou para o relógio, mordendo o lábio inferior enquanto olhava para a floresta.
Ela não queria se impressionar com isso. A ômega pegou seus tênis de corrida brancos e os segurou na mão, os fones de ouvido brancos balançando no material cinza encharcado de suor de sua camiseta. Quando ela emergiu da floresta, Nate abriu a boca e foi em direção a ela. Ela continuou correndo como se ele não estivesse lá, passando por ele sem nem olhar.
"Você está brincando comigo!?" Ele gritou, olhando para o relógio novamente. "Você já está—Quando você dorme?!"
Allie já tinha tido o suficiente disso. Ele estava a incomodando continuamente há três dias. Ela se jogou na cadeira e contou tudo para Ashton.
"Essa é a maneira dele de se desculpar," ele simplesmente disse.
"O quê?!" A ômega piscou.
Ashton suspirou. "Eu sei! Ele me perguntou por que você saiu da cafeteria com raiva, e eu contei para ele."
Ela soltou um suspiro agudo com isso. Então ele sabia que o comentário foi insensível, mas em vez de se desculpar diretamente, ele estava fazendo essas palhaçadas. Como ela não poderia ficar irritada com isso?
"Eu sei o que você está pensando, mas você deveria dar uma chance a ele. Ele não é um cara ruim."
"Tanto faz."












































