Festa fúnebre...

...e pegando a mão do diabo

Sunny Hirsch trancou-se na despensa da cozinha.

"Sunny," disse Maria do lado de fora. "Saia, por favor. Fale comigo."

Sua voz estava abafada pela porta de madeira.

Sunny Hirsch estava com medo. Ela acabara de ver uma colega ser estuprada e ninguém sequer tentou fazer nada a respeito.

Isso quase tinha acontecido com ela!

Sunny Hirsch abraçou os joelhos e escondeu a cabeça ali. Deveria voltar? Ela estava sozinha naquele mundo onde os ricos fazem o que querem.

"Sunny," chamou Maria Esposito novamente. Sua voz parecia distante. Como um sonho.

A vida de Sunny mudou completamente na última semana após a morte de seu pai. Ela já havia perdido a mãe, mas perder o pai era algo que não esperava. Foi tão de repente. É engraçado como as crianças sabem que é a ordem natural. Papai e mamãe vão partir primeiro. Mas isso não torna a dor menos intensa.

1 SEMANA ATRÁS

17h — Los Angeles, Califórnia

Sunny estava sentada ao lado do caixão no funeral. Ela estava com os fones de ouvido e não olhava para nada em particular na tela do celular.

"Ela é fria," as pessoas diziam.

"Ela nem chora," comentavam pelas suas costas.

"...rua à noite por causa de uma única vela. Ela é tão mimada."

O caixão estava fechado. Mas havia uma foto de Joe Hirsch, pai de Sunny, ao lado do caixão. Ele se parecia muito com Sunny. Loiro, olhos azuis. Mas seus olhos estavam escondidos por óculos e ele tinha uma barba rala. Mesmo na foto, ainda havia a sensação de que ele iria contar algumas piadas de pai.

"É hora do enterro," alguém disse. "Temos que ir."

Estava chovendo na cova e a terra estava molhada. Sunny Hirsch lembrou-se de como seu pai costumava dizer que amava o cheiro da terra durante a chuva. Eles tomavam café na varanda enquanto sentiam o cheiro da chuva caindo no quintal. Por causa dessa memória vívida, Sunny Hirsch não ouviu uma palavra do padre rezando. Até que os coveiros jogaram terra sobre seu pai, ela lembrou-se das últimas palavras de Joe,

"A única coisa que eu quero é ver você sorrir, Sunny."

Sunny tirou os fones de ouvido e sorriu. As pessoas ao redor ficaram horrorizadas com a cena. Mas enquanto as lágrimas caíam dos olhos de Sunny pela primeira vez, ela sorria para o caixão sendo coberto.

"Tão sem vergonha..."

"Oh, meu Deus."

"Pior filha do mundo."

A boca de Sunny doía enquanto ela sorria. Todos os seus dentes estavam à mostra. Era o maior sorriso que ela já tinha visto em sua vida. Era a maior dor que ela sentiria até sua morte.

Isso é o que Sunny pensava até sua irmã Luna aparecer (com seu namorado italiano) enquanto o pai estava quase todo enterrado. Sunny não sabia, mas aquilo era apenas o começo do seu fim.

Luna Hirsch pagou por um carro para levá-los de volta para casa. Luna parecia muito arrependida ao ver o estado quebrado de sua irmã.

Enquanto as irmãs (e o italiano) voltavam para casa no carro de uma Los Angeles chuvosa, Luna Hirsch perguntou algo que fez Sunny gritar, "O quê?"

Assim que o motorista parou em frente à casa onde as irmãs Hirsch cresceram, Sunny saiu do carro.

"Você está brincando, né?" Sunny gritou.

"Sunny! Espere," pediu Luna.

Sunny não estava brava com Luna por não ter voltado a tempo. Ela nem estava brava por Luna ter chegado atrasada ao funeral do pai. Mas aquela pergunta a deixou com raiva pela primeira vez.

"Eu não vou para a Itália, Luna. Acabei de perder o papai!"

"Eu também o perdi," lembrou Luna.

"A chuva parou," notou Sunny de repente.

Sunny pensou como era irritante aquele dia ter ficado tão bonito após o funeral do pai. Parou de chover. O céu estava azul e não havia uma nuvem no céu. Borboletas voavam ao redor das flores que Joe havia plantado no jardim da frente da casa.

"Desculpe, Luna. Mas estou tentando manter meu homem longe daquela louca. Ela é obcecada por ele e o pai dela é um mafioso."

"Eu não sei falar italiano."

"Podem tentar matá-lo se ele não fizer o que ela quer."

"Eu não tenho passaporte."

"A vida dele pode estar em perigo real."

"Você tem certeza de que sabe o que ele quer?" Sunny Hirsch perguntou.

"Ele quer paz. Eu também quero essa paz."

"Você não se importa com o que eu quero?"

Luna Hirsch pegou a mão da irmã.

"Eu sei que você quer ficar aqui e transformar a casa em um santuário para o papai. Mas eu realmente acho que você deveria ir embora. A última coisa que o papai gostaria é que você fosse infeliz."

Mas surpreendentemente, não levou muitos dias para Luna convencer Sunny. Luna já tinha uma passagem de avião e um emprego contratado em Milão. Ela só precisava que Sunny a substituísse no trabalho durante os 3 meses restantes do contrato. Depois disso, Sunny poderia ser demitida sem que Luna pagasse uma multa terrivelmente alta.

"Você tem certeza de que as pessoas não vão notar?" Sunny Hirsch perguntou. "Somos muito parecidas como irmãs, mas vamos lá."

Olhar para sua irmã Luna era como olhar no espelho. O mesmo cabelo loiro claro, enormes olhos azuis como o céu e nariz pequeno. Após a puberdade, elas poderiam facilmente fingir que compartilharam 9 meses na barriga como gêmeas.

"Eu acabei de pedir transferência para Milão," disse Sunny Hirsch. "Ninguém me conhece lá. Eu prometo."

"O que vão dizer sobre o meu nome?"

"Apenas diga que é um erro. Hirsch nem é um sobrenome comum. Eles não vão fazer um grande alarde se você não fizer."

E foi assim que Sunny Hirsch de alguma forma chegou a Milão. Ela estava aliviada por finalmente chegar, mas quando viu a notícia de que um carro havia pegado fogo em frente a um prédio de uma empresa, Sunny pensou que tinha acabado acidentalmente na França. Ela não sabia que os italianos também tinham esses... hobbies.

Sunny pegou suas malas e entrou na Itália pela primeira vez na vida.

"Olá," disse uma mulher atrás dela.

A mulher tinha cabelo muito escuro, olhos castanhos e aquele rosto bonito italiano. Ela estava vestida com um sobretudo azul-marinho e sorria ao reconhecer Sunny.

"Sei Luna, vero?" (Você é a Luna, certo?)

Sunny Hirsch só entendeu a parte "Luna", então ela assentiu. Uh-huh. Luna. Essa é ela.

"Sono del Wolf Group. Maria Esposito." (Sou do Grupo Wolf. Sou Maria Esposito.)

Maria... Ok... Sunny Hirsch assentiu.

"Possiamo andare adesso?" (Podemos ir agora?)

Ainda assentindo, Sunny seguiu desajeitadamente.

"Sai che dovrai lavorare con la Cavalleria, vero? Il proprietario del Gruppo Wolf ha 10 figli. Non tutti sono facili da affrontare." (Você sabe que terá que trabalhar com a Cavalleria, certo? O dono do Grupo Wolf tem 10 herdeiros. Nem todos são fáceis de lidar.)

Sunny Hirsch assentiu.

"Perché mi sembra che tu non parli italiano?" (Por que sinto que você não fala italiano?)

Sunny assentiu novamente.

Maria Esposito parou e olhou para Sunny Hirsch. Sunny deu seu melhor sorriso simpático.

"Forse è meglio così." (Talvez seja melhor assim.)

Sunny Hirsch sempre pensou que sua irmã trabalhava em um conglomerado como estagiária. Ternos, papéis, prédios cinzentos. Em vez disso, Maria Esposito levou Sunny Hirsch para um bairro residencial.

O carro de Maria parou em frente a enormes portões e havia guardas armados. A segurança era pesada.

"Mi sento come se ti avessi portato direttamente nella tana del leone... Tana di lupi, in realtà." (Sinto como se tivesse te levado direto para a toca do leão... Toca de lobos, na verdade.)

"Molto buono," Sunny Hirsch respondeu com um sorriso.

A entrada da mansão era imponente e majestosa. Um portão de ferro forjado abria-se para um caminho de paralelepípedos que levava à porta da frente. De cada lado do caminho havia canteiros de flores coloridas e arbustos bem aparados. No centro do jardim, uma fonte de mármore jorrava água. Sobre a fonte, uma estátua de bronze de um lobo erguia a cabeça para o céu, como se uivasse para a lua. A estátua era realista, com o pelo esculpido em detalhes. A mansão era de pedra branca com um telhado de terracota. Tinha três andares e muitas, muitas janelas. Aquele lugar era poderoso e intimidante — como se todos os meus segredos e medos fossem expostos no chão de mármore, pensou Sunny.

Maria Esposito estacionou o carro longe da casa principal. Ela olhou para Sunny Hirsch muito seriamente.

"Primeiro de tudo," disse Maria em inglês perfeito "preciso te contar sobre os 9 filhos de Antonio Blaze. E mais importante: por que você nunca deve deixá-los te seduzir."

PRESENTE — Despensa da Cozinha da Casa Moonstone

"O que aconteceu?" perguntou uma voz masculina, profunda e suave, do lado de fora.

"Ela se trancou," disse Maria.

"Luna?" perguntou o homem. "Sou eu."

Ele conhece minha irmã?, pensou Sunny Hirsch, levantando a cabeça.

Sunny Hirsch destrancou a porta. Ela ficou chocada ao encontrar um dos irmãos Blaze. Alessandro Blaze era ainda mais bonito visto de perto. Cabelo vermelho escuro, olhos verdes incríveis. Como esmeraldas. Se ele ficasse parado tempo suficiente e alguém colocasse uma placa, você acreditaria que ele era uma obra de arte.

"Estou com medo," admitiu Sunny Hirsch baixinho.

Alessandro Blaze sorriu um pouco e ofereceu sua mão. Ele tinha uma mão enorme e forte. Como se fizesse exercícios pesados.

"Vou te ajudar," prometeu Alessandro Blaze, oferecendo a mão para ajudá-la a se levantar. "Eu te trouxe aqui, então vou ser responsável por você. Até o fim."

Sunny Hirsch sabia que não deveria fazer isso. Mas de alguma forma, ela simplesmente pegou a mão dele. Talvez estivesse hipnotizada pelos olhos verdes dele, talvez ela apenas precisasse de alguém (qualquer um) para segurar naquele momento assustador. Mas ela fez.

Sunny Hirsch se perguntou por que ele havia dito aquilo. Alessandro Blaze conhecia sua irmã? O que ele havia prometido a Luna? Ela tinha muitas perguntas, mas naquele momento ela apenas aceitou cegamente a proteção dele.

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