Capítulo 4 — O quarto compartilhado
Passei o dia inteiro trancada no meu estúdio. Não tinha vontade de falar com ninguém, muito menos de encontrar Gael. A notícia de que Bella havia acordado ecoava na minha mente. Por que esconderam isso de mim? Por que—quando sou a irmã dela? Concordei com esse casamento absurdo só por ela, pelo bem dela. E agora… ela me despreza.
Vaguei sem rumo em frente à tela, mas não consegui pintar uma única linha. A dor era mais forte que qualquer inspiração.
Peguei meu telefone. Não suportava mais a incerteza no meu peito.
Tocou duas vezes antes de minha mãe atender.
—“Aurora, querida…”
—“Oi, mãe. Como você está?”
—“Estou bem, querida. E você? Como seu marido está te tratando?”
—“O que você acha? Mal o vejo. Mas não estou ligando por causa dele. Por que não me contou que Bella acordou?”
Seguiu-se um silêncio constrangedor. Senti a linha queimando em meus dedos. Então veio o suspiro dela, pesado de culpa, doloroso de ouvir.
—“Desculpe… ela tem perguntado por você, mas quando seu pai contou que você se casou com o noivo dela… ela surtou.”
—“Vocês não explicaram que fiz isso por ela? Que só concordei para que ela pudesse receber o melhor tratamento?”
—“Sim, querida. Mas ela está confusa. Ela se sente traída. Prometo, quando ela se sentir melhor, vou falar sobre você novamente.”
—“Tudo bem… Se ela não quiser me ver, vou aceitar. Diga a ela que a amo. E se ela me pedir, vou me divorciar do Gael imediatamente.”
—“Cuide-se, querida…”
Desliguei com um nó no peito. Senti-me traída por todos. Minha irmã, minha mãe, meu pai… até por mim mesma. Chorei em silêncio, com a testa apoiada nos joelhos, como uma menina perdida.
Nesse momento, duas batidas suaves na porta me fizeram levantar a cabeça.
—“Senhora…” Era a voz de Juana, calma e suave. “O Sr. Gael gostaria que você o acompanhasse no jantar.”
Olhei para ela confusa. Jantar comigo? Agora?
—“Tem certeza de que ele pediu por mim?”
—“Sim. Ele disse: ‘Diga a ela para descer para o jantar.’”
—“Tudo bem,” respondi. “Vou me trocar.”
Subi para o meu quarto, com o estômago embrulhado. Tomei banho devagar, como se tentasse lavar toda a raiva. Vesti algo confortável: jeans justos e uma blusa de seda branca. Nada chamativo. Nada que Bella escolheria.
Quando desci, a sala de jantar já estava arrumada. As luzes brilhavam calorosamente acima da longa mesa polida. Gael estava lá, impecável como sempre, vestido com um terno preto e segurando uma taça de vinho. Ele me olhou com aquela expressão indecifrável.
—“Você demorou.”
—“Eu não sabia que era esperada para dividir a mesa com você. Você foi muito claro na nossa noite de núpcias,” respondi friamente.
Por um momento, ele pareceu surpreso. Então deu um gole e virou a cabeça.
—“Juana, pode servir.”
Comemos em completo silêncio. Mal toquei na comida, apenas a empurrando com o garfo. Meu estômago estava apertado, minha garganta tensa.
—“Você não vai comer?”
—“Não tenho apetite. Vim porque Juana pediu.”
—“É seu dever como esposa jantar comigo.”
Lancei-lhe um olhar de desprezo.
—“Pelo que me lembro, você não se importa que eu seja sua esposa. Você disse que só fingiríamos em público. E não há ninguém aqui para enganar.”
—“Os empregados poderiam falar.”
Deixei escapar uma risada amarga.
—“Agora você se importa? Passei uma semana sozinha nesta casa. Eles já falam. Olham para mim com pena. Acham que você se casou comigo por obrigação... e não estão errados.”
—“Isso vai mudar a partir de agora. Vamos jantar juntos.”
Não respondi. Qual era o ponto de discutir? Era óbvio que ele só se importava com sua imagem — não com a gente.
—“Senhora, você não comeu nada,” Juana interrompeu enquanto recolhia o prato.
—“Desculpe, Juana. Eu simplesmente não estou com vontade de comer.”
—“Você não deveria pular refeições. Se você comer, eu trago uma fatia de torta de mirtilo. Que tal?”
Seu olhar gentil me comoveu. Notei que Gael também estava me olhando, curioso. Mas o ignorei.
—“Tudo bem. Eu vou comer. Sei o quanto você trabalha duro,” disse, sorrindo para Juana.
E comi. A torta estava deliciosa. Pela primeira vez em dias, senti algo próximo de alívio.
—“Eu não sabia que você gostava tanto de doces,” Gael comentou.
—“Minha mãe costumava assar quando éramos pequenos. Bella não gostava, então eu comia por nós duas. Não queria que minha mãe se sentisse mal.”
—“E você não engorda com todo esse açúcar?”
—“Não. Eu malho. Além disso, sou única,” sorri pela primeira vez naquela noite.
Ele assentiu com um olhar curioso... como se lhe doesse descobrir algo sobre mim.
Levantei e fui para o meu quarto. Tinha sido um dia longo e exaustivo em todos os sentidos.
Escovei os dentes e vesti meu pijama de sempre: calcinha e um suéter grande. Nada especial. Apenas algo confortável para dormir.
Estava prestes a me deitar quando ouvi a porta se abrir. Pensei que fosse Juana trazendo água, então falei sem olhar.
—“Juana, deixe a jarra na mesa, por favor.”
Nenhuma resposta.
O som da água correndo no chuveiro me fez virar. E lá estava ele. Gael. Nu. No banheiro de vidro.
—“Que diabos...?” murmurei, congelada.
O banheiro da suíte tinha paredes de vidro transparente, o que nunca me incomodou — até agora. Deslizei para debaixo das cobertas e cobri meu rosto com um livro, esperando que ele terminasse para que eu pudesse gritar com ele. Mas quando ele saiu, estava usando apenas uma toalha em volta da cintura.
—“Este é o meu quarto. Por que você não usou outro?”
—“Porque sou seu marido. Não há nada de errado em você me ver nu.”
—“Pervertido!”
Ele sorriu descaradamente e entrou no closet.
Apaguei a luz, fervendo de raiva. Fechei os olhos e tentei dormir. Mas o colchão se mexeu. Ele estava se deitando na cama.
Eu pulei.
—“O que você está fazendo?”
—“É nossa cama. Mudei de ideia. Se não dormirmos juntos, não será crível que nos casamos por amor.”
—“Você disse que não compartilharíamos a cama.”
—“Relaxa. Não tenho intenção de te tocar.”
Ele me olhou com uma calma enlouquecedora. Eu sustentei seu olhar por alguns segundos... então virei de costas sem responder. Não valia a pena a briga.
Mas no escuro, enquanto ouvia sua respiração ao meu lado, percebi algo mais aterrorizante do que sua presença:
Que talvez, um dia, a distância entre nós... pudesse começar a doer.
