Capítulo 5 — A cláusula amaldiçoada.
Acordei com o corpo dormente e meu espírito ainda mais exausto que na noite anterior. O colchão havia afundado ligeiramente do meu lado. Imediatamente soube que ele ainda estava lá.
Gael.
Eu podia ouvir sua respiração calma e constante, como se ele não se incomodasse nem um pouco por ter passado a noite ao lado de alguém que ele nem conhecia. Abri os olhos lentamente, sem me mexer. A suave luz da manhã filtrava pelas cortinas. Por um momento, senti-me presa em uma cena que não me pertencia. Como se alguém tivesse escrito esse roteiro para mim.
Meu corpo estava tenso. Não tive coragem de me mexer a noite toda por medo de tocá-lo.
Não porque quisesse evitar sua proximidade—
Mas porque não queria ser lembrada de como toda essa situação era absurda.
Eu era casada com um homem que não me queria. Forçada a compartilhar uma cama que carecia de calor. Confinada em uma prisão luxuosa com barras invisíveis.
Virei-me cuidadosamente e o vi.
Ele estava acordado. Olhando para o teto. Como se estivesse assim há horas.
"Bom dia," disse suavemente.
"Levante-se. O café da manhã estará pronto em vinte minutos," ele respondeu, sem nem olhar para mim.
Não houve um "Como você dormiu?" ou sequer uma formalidade vazia. Apenas ordens.
Me obriguei a sair da cama, peguei meu roupão e fui ao banheiro. Lavei o rosto com água fria, tentando apagar os traços da noite. Olhei para mim mesma no espelho e mal reconheci a expressão nos meus olhos. Frustração. Tristeza. Aceitação.
Quando desci para a sala de jantar, Gael já estava lá, sentado ereto, folheando o jornal como se fosse um dia normal. À sua frente, o café da manhã estava perfeitamente arranjado: café recém-passado, frutas cortadas com precisão, pães quentinhos.
Sentei-me em silêncio. Servi-me de suco. Não tinha apetite, apenas nervosismo. A tensão no ar era tão densa que era difícil respirar.
"Você vai ver a Bella hoje," ele disse de repente, sem tirar os olhos do jornal.
Minha mão congelou no ar, a caminho da xícara.
"O quê...?"
"Ela pediu para te ver, esta manhã. Tudo está arranjado. O motorista te levará em uma hora."
Pisquei, surpresa.
"E você não vai estar lá?"
"Não," ele respondeu, sem hesitação. "Será melhor se vocês conversarem sozinhas. Mas tome cuidado. Não a deixe chateada. Não faça nada estúpido. Bella ainda está frágil... emocionalmente instável."
Senti meu estômago revirar de calor.
"O que isso quer dizer? Que eu devo agir como se fosse a culpada?"
Ele finalmente olhou para mim. Seus olhos estavam frios.
"Significa não fazer ela se arrepender de ter pedido para te ver. Se ela ficar chateada, não haverá outra visita. Não estrague isso."
Mordi o interior da bochecha para não dizer o que realmente pensava. Ela foi quem escolheu arriscar a vida correndo. Eu não queria me casar com ele, e ainda assim todos me tratavam como se eu fosse a impostora. Estava cansada de carregar o peso das escolhas dos outros.
Mas não disse nada. Não na frente dele.
Ele terminou seu café, levantou-se, pegou o casaco e, antes de sair, disse uma última coisa:
"O carro estará pronto em meia hora. Não se atrase."
E saiu.
**
A viagem até o hospital foi silenciosa. O motorista—o mesmo que havia me levado até a mansão—mantinha os olhos na estrada. Eu olhava para o chão. Minhas mãos tremiam no colo. Eu ia ver minha irmã. Minha outra metade. A mulher cuja vida eu supostamente roubei. Ou pelo menos, era isso que todos acreditavam.
Quando chegamos, a enfermeira me informou que Bella estava acordada e que eu podia entrar. Meu coração batia tão forte que doía.
A porta dela estava entreaberta.
Bati suavemente.
“Bella?”
Ela virou o rosto para mim. Seus olhos estavam fundos, a pele pálida... mas sua expressão permanecia intacta. Desafiante. Ferida.
“Entre,” disse ela com uma voz rouca.
Eu entrei e fechei a porta atrás de mim. Minhas pernas pareciam de papel.
“Você parece... melhor.”
“Melhor do que quando eu estava em coma? É, acho que sim.”
Suas palavras eram como facas.
“Eu vim porque... eu precisava te ver. Queria saber como você estava. E porque eu quero consertar isso. Sei que você está com raiva, mas se você quiser que eu me divorcie, eu posso fazer isso. Não estou interessada no Gael.”
O quarto se encheu de um silêncio pesado. E de repente, de um canto, uma sombra emergiu.
“Isso não será possível,” disse meu pai.
Eu me virei bruscamente. Não tinha notado sua presença. Ele estava lá, como sempre, observando das sombras. Controlando tudo.
“O que você quer dizer?” perguntei, com a voz trêmula.
“Que você não pode se divorciar. Não sem consequências. O contrato de casamento que você assinou—que todos nós assinamos—proíbe a dissolução do casamento por cinco anos. Se você—ou Gael—quebrarem o contrato antes, a parte que solicitar o divórcio deve pagar uma compensação de cem milhões de dólares.”
“Você está brincando.”
“Eu pareço alguém que brinca?” ele respondeu, cruzando os braços. “Gael protegeu seu investimento. Você assinou. É isso.”
Olhei para Bella. Seu rosto mostrava surpresa e fúria contida.
“Você... não sabia,” murmurei.
Ela balançou a cabeça lentamente. Seus lábios tremiam. De repente, ela cobriu o rosto com as mãos e começou a chorar. Ou pelo menos, parecia chorar.
“Pai!” gritei com raiva. “Como você pôde fazer isso?! Sem me contar!”
“Não era necessário,” ele disse, sem um pingo de compaixão. “Eu assinei por você. Como seu tutor legal, eu tinha todo o direito.”
Fui até Bella e peguei sua mão.
“Desculpe... Eu não fazia ideia. Eu prometo. Se eu pudesse, sairia disso hoje mesmo. Mas não tenho como.”
Ela me olhou com os olhos cheios de lágrimas, mas havia algo mais em seu olhar. Um brilho. Um indício de algo que eu não conseguia identificar.
“Não se preocupe, Aurora,” ela disse com uma voz trêmula. “Vamos consertar isso. Juntas.”
Não sei por quê... mas aquelas palavras me gelaram mais do que o contrato. Mais do que os cem milhões. Mais do que a noite sem amor com Gael.
Porque pela primeira vez, percebi que Bella... não estava apenas sofrendo.
Ela estava tramando.
E eu fazia parte do jogo dela.
