Capítulo Um

Eu fiquei paralisada na beirada da sala, invisível, como se as sombras tivessem me engolido. Meus pais estavam ajoelhados no centro do chão, segurados por dois homens tão enormes que pareciam mais troncos de árvore do que carne e osso. O ar era sufocante, pesado com uma violência que pressionava meu peito até eu mal conseguir respirar.

"Diga onde está a criança," rosnou o mais magro dos três, sua voz serpenteando pela sala como fumaça. "Responda, e farei com que suas mortes sejam rápidas. Recuse, e arrancarei cada grito de suas gargantas enquanto o outro assiste."

Meu pai cuspiu sangue e fúria em igual medida. "Vá para o inferno. Nunca entregaremos nossa criança."

Ele sempre foi gentil, infinitamente paciente—mas agora sua voz cortava como aço.

Lágrimas queimavam minhas bochechas enquanto eu percebia que eu era a criança que eles queriam. Meus joelhos tremiam com a vontade de correr até ele, de implorar para que me levassem no lugar deles, mas então os olhos da minha mãe encontraram os meus. Ela fez um leve movimento com a cabeça e murmurou uma única palavra: Corra.

A lâmina brilha ao subir, captando a luz uma última vez antes de cair—

—e então a memória se desfaz, rasgando-se em branco. Os gritos se alongam, desaparecendo em sussurros, até que resta apenas uma névoa ofuscante, girando e girando até que eu me perco dentro dela.

Calor pressionava minhas costas, círculos constantes me ancorando na tempestade. Uma voz atravessou a névoa, suave e persuasiva, puxando-me de volta ao presente.

"Falencia, querida, está tudo bem. Você está segura. Volte."

Eu ofeguei, meus pulmões puxando o ar como se eu estivesse me afogando. A claridade desapareceu, e meu quarto lentamente tomou forma—a luz fraca do despertador, o chão de madeira fria sob minha bochecha, o tremor no meu corpo que se recusava a parar.

Virei a cabeça para encontrar Berik, seus olhos escuros cheios de preocupação, sua mão nunca pausando seu ritmo gentil nas minhas costas. Ela parecia mais velha em momentos como este, sombras de tristeza esculpidas profundamente em seu rosto.

"Você estava saindo pela janela quando te encontrei," murmurou ela, sua voz em partes iguais de repreensão e conforto. "Eu mal consegui te colocar no chão a tempo."

Um gemido amargo escapou de mim enquanto eu passava os dedos trêmulos pelo cabelo. "Eu queria que esses episódios parassem. Parece que estão me devorando viva."

"Eles têm acontecido com mais frequência." A voz de Berik carregava um peso que eu não queria nomear. "Você sabe por quê, querida?"

Mordi o lábio com força, segurando as lágrimas que queimavam atrás dos meus olhos. Eu odiava quando ela me olhava assim—como se eu ainda fosse a criança quebrada que ela acolheu anos atrás. "Não. Nada me vem à mente."

A porta rangeu ao abrir, derramando uma fresta de luz do corredor no quarto. Freyja se encostou no batente, seu cabelo ruivo despenteado de sono, seus olhos verdes arregalados de preocupação.

"Outro pesadelo?" ela perguntou suavemente.

"Sim," eu sussurrei, minha voz fraca, desfiada nas bordas.

Freyja atravessou o quarto e se sentou na beirada da minha cama, dando tapinhas no espaço ao lado dela. "Eles estão piores ultimamente. Você tem certeza de que está bem?"

"Não sei." Minha mandíbula se apertou enquanto a frustração fervilhava sob minha pele. "Eu queria entender por que eles não param."

Berik me deu um sorriso triste, afastando uma mecha de cabelo do meu rosto. "Quer que eu ligue para sua conselheira amanhã? Talvez ela possa ajudar."

Soltei uma risada seca, amarga demais para ser reconfortante. "Sem querer ofender, mas ela é inútil. Age como se meus pesadelos fossem apenas... sentimentos fantasiados. Como se não tivesse ideia do que eles realmente significam."

Freyja pegou minha mão, apertando-a gentilmente. "Então vamos descobrir juntos. Você não está sozinha."

Por um momento, o silêncio nos envolveu, pesado, mas quase sagrado. Então Berik se levantou, sua expressão suavizando. "Vou fazer chocolate quente. Caramelo salgado?"

Freyja e eu respondemos em uníssono, um sorriso frágil surgindo em meus lábios. "Caramelo salgado."

Berik riu e saiu, deixando para trás o leve tilintar das canecas na cozinha.

Freyja ficou perto, seu calor constante ao meu lado. "Sabe..." ela hesitou, "o aniversário é amanhã. A morte deles—e seu aniversário. Talvez seja por isso que os sonhos estão voltando."

As palavras me atingiram profundamente, afiadas o suficiente para tirar meu fôlego. Eu nem tinha percebido que a data estava tão próxima.

"Odeio que você compartilhe seu aniversário com uma lembrança tão feia," Freyja sussurrou. "Você deveria ter algo melhor."

Fechei os olhos, deixando suas palavras se assentarem sobre mim como um cobertor. "Talvez um dia eu tenha."

Na manhã seguinte, tudo começa normalmente, alarme estridente, cobertores enrolados nas minhas pernas e a percepção de que eu estava prestes a enfrentar mais um dia de pesadelo em um lugar de total besteira. Sento-me, desenrolando minhas pernas dos cobertores, suspirando enquanto coloco os pés no carpete felpudo que cobre o chão de madeira, caminhando silenciosamente até o banheiro.

Faço uma careta ao me olhar no espelho da pia; honestamente, não tenho a melhor autoestima quando se trata da minha aparência. Não me acho particularmente bonita, meu corpo não é magro como o de uma modelo, quero dizer, já me disseram que tenho curvas nos lugares certos, mas sempre quis ser magra como uma modelo, igual a Freyja e suas amigas. Suspiro desanimada e entro no chuveiro quente, ficando sob a água escaldante por alguns minutos, permitindo que o calor penetre na minha pele e alivie os nós e tensões que se acumularam nos meus músculos durante o sono. Enxáguo meu cabelo preto como carvão, que chega um pouco abaixo do meio das costas, com meu shampoo de cereja azeda, e repito o processo com o condicionador. Enquanto o condicionador age no meu cabelo, lavo meu corpo e termino minha rotina com meu limpador facial e esfoliante. Enxáguo o condicionador do cabelo antes de desligar a água e sair para o tapete felpudo que fica fora do boxe. Termino minha rotina matinal e volto para o meu quarto.

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