Capítulo 3: Vykhor Kael'seth

Ponto de Vista de Vykhor

Esses humanos não têm ideia do que capturaram. Eles acham que sou fraco, vulnerável, só porque o ataque patético deles me pegou de surpresa e minha nave foi abatida. Tolos. Eles nem sabem o que é um Kael'Tarien ou o que isso significa. Para eles, sou apenas mais um prisioneiro para interrogar e brutalizar. Mas se soubessem... Se tivessem a menor ideia da força que possuo, do poder que meu nome carrega, não ousariam tocar em mim.

Eles me espancaram, me questionaram, tentaram quebrar minha vontade. Normalmente, eu já teria silenciado todos eles, seus corpos caídos aos meus pés. Mas aqui, trancado nesta cela fria, ferido e enfraquecido, tenho que admitir que estou temporariamente à mercê deles. Minha prótese... minha preciosa prótese... danificada durante a queda. É minha arma, meu vínculo com a tecnologia Kael'Tarien. Sem ela, estou incompleto. Mas é só uma questão de tempo até eu consertá-la. Então, esses tolos vão se arrepender amargamente de não terem me matado quando tiveram a chance.

Por enquanto, tenho que ser paciente. Eles não trataram meus ferimentos adequadamente, e cada movimento me causa mais dor. A negligência deles só aumenta o ódio que sinto. Mas não vou deixar essa raiva me consumir. Não. Estou mantendo-a aquecida, deixando-a amadurecer em algo muito mais perigoso. A vingança está chegando, isso é certo. Mas deve ser bem orquestrada, uma punição calculada digna do príncipe que eu fui.

Eles acham que sou fraco porque só dei meu nome e raça. Se soubessem o quão insignificante essa informação realmente é... Eles não têm ideia do que isso significa para eles. Suas perguntas são estúpidas, seus métodos rudes. Mas eu não vou falar. Eles não vão conseguir nada de mim. Tudo o que preciso é de tempo—para consertar minha prótese, para contatar minha nave e chamar uma equipe de extração. Depois disso... talvez eu lide com eles. Ou talvez eu os deixe apodrecer na ignorância. Ainda não decidi.

Mas uma coisa é certa: não ficarei aqui por muito tempo. Essas paredes não vão me segurar. E quando eu estiver livre, quando recuperar todo o meu poder, eles finalmente entenderão o que meu nome realmente significa. Eu sou Vykhor Kael'seth, e nunca esqueço uma ofensa.

Assim como nunca esqueço uma traição. Ainda me lembro daquele dia fatídico como se fosse ontem. O dia em que tudo mudou, quando o mundo que eu conhecia desabou em um instante. Meu pai, Kael'vryn, um rei nobre e poderoso, respeitado por todos. Minha mãe, Althara, incomparável em sabedoria, uma rainha amada por seu povo. Eles personificavam tudo de grandioso em nossa civilização. E eu, seu herdeiro, preparado minha vida inteira para assumir, para continuar a grandeza dos Kael'Tariens. Mas o destino tinha outros planos.

O golpe veio de repente, como uma tempestade em um céu antes claro. Os traidores, antigos conselheiros próximos, haviam planejado tudo nas sombras, com uma traição que eu não vi chegando. Como pude ser tão cego? Naquele dia, o palácio estava em chamas, os gritos dos meus entes queridos ecoando pelos corredores que eu havia percorrido toda a minha vida. Meu pai, abatido diante dos meus olhos, a desafiadora ardência em seu olhar até seu último suspiro. Minha mãe, caída enquanto protegia o mais jovem de nossa linhagem, sacrificando-se para lhes dar uma chance de fugir. Mas foi tudo em vão. Estão todos mortos. Cada um deles.

Ainda me vejo, gritando de raiva e agonia, tentando lutar contra os traidores para alcançar meus pais. Mas era tarde demais. O horror daquela noite me mudou para sempre. Perdi mais do que um braço naquele dia. Perdi meu mundo, minha fé na honra e lealdade, minha família, e com eles, uma parte de mim. Esta prótese que uso agora, é mais do que apenas uma ferramenta. É um lembrete constante do que sacrifiquei, do que perdi, e do que devo recuperar.

Se esses humanos soubessem o que eu suportei, o que fiz para sobreviver desde aquele dia, ainda teriam a audácia de me desprezar? Não, eu não acho. Eles não conseguem nem compreender a dor que forjou o guerreiro que me tornei. Eles não entendem o que significa perder tudo, ser traído por aqueles em quem confiava, ser forçado a fugir do próprio mundo e se esconder entre as estrelas, buscando vingança.

Eu viajei por mundos que esses tolos nem conseguem imaginar. Sobrevivi a batalhas que eles nem sabem que existem. Destruí inimigos muito mais formidáveis do que eles, tudo com um objetivo em mente: fazer aqueles que tiraram tudo de mim pagarem. Eles acham que podem me quebrar com seus métodos primitivos, mas estão gravemente enganados. Sou forjado na dor, e essa dor é minha força.

Esses idiotas não sabem nada sobre o que significa ser Kael'Tarien. Eles não percebem que cada golpe que desferem só alimenta minha determinação. Um dia chegará em que eles se arrependerão de sua arrogância. Eles entenderão que não sou apenas um cativo, mas um rei caído em busca de justiça. E nesse dia, eles conhecerão o verdadeiro significado do medo.

Então, ouço passos pesados no corredor. Já sei quem é antes mesmo de a porta da cela se abrir. Kane, aquele humano arrogante, sempre com seus capangas. Cada passo que ele dá soa como uma declaração de sua superioridade imaginária. Ele pensa que é intocável, poderoso, mas não passa de um inseto desfilando na frente de um gigante acorrentado.

A porta range ao se abrir, deixando entrar a luz dura do corredor, que delineia sua silhueta arrogante. Kane entra com aquele sorriso que conheço bem, o que mistura desdém com uma confiança exagerada em seu próprio poder. Ele começa seu discurso habitual, pingando condescendência, achando que suas palavras podem me alcançar, me fazer duvidar, ou pior, me assustar.

"Vykhor Kael’seth," ele começa, saboreando cada sílaba do meu nome. Ele circula ao meu redor como um predador pensando que tem sua presa, alheio ao fato de que ele mesmo está andando em uma linha tênue. Ele fala sobre minha situação, a suposta superioridade dos humanos, como estou à mercê deles. Quanta ignorância.

Não me movo, não reajo. Suas palavras são vento, sem significado, incapazes de corroer minha determinação. Mas enquanto ele continua, algo chama minha atenção.

"Evelyn Ashcroft."

Um nome que eu não tinha ouvido antes. Kane faz uma pausa, observando minha reação, ou melhor, minha falta de reação. Ele pensa que introduziu uma nova ameaça, uma nova alavanca para me quebrar. Evelyn Ashcroft, uma mulher que ele descreve como tendo uma inteligência rara, capaz de quebrar até as mentes mais fortes, de reparar os corpos mais danificados. Uma especialista, ele diz, alguém que ele trouxe pessoalmente para mim. Sua voz goteja satisfação enquanto fala sobre ela, como se acreditasse que essa informação me faria vacilar.

Mas ele está errado. Não tenho medo de mais uma tentativa humana de me quebrar. No entanto, algo nisso me inquieta. Esse nome, Evelyn Ashcroft, desperta uma cautela em mim que não posso ignorar. Kane é um idiota, cego pela sua arrogância para entender a verdadeira natureza do que está lidando. Mas essa mulher... ela pode ser diferente. Não uma bruta, mas uma verdadeira adversária.

Kane continua a falar, mas suas palavras se tornam ruído de fundo. Minha mente está em outro lugar. Evelyn Ashcroft. Talvez ela não seja como os outros. Talvez ela seja capaz de entender o que eu realmente sou, de ver além da aparência do guerreiro Kael'Tarien. Talvez, só talvez, ela possa ser um verdadeiro desafio.

Kane termina seu discurso, inclinando-se para mim com aquele olhar presunçoso. "Prepare-se, Kael’seth. Evelyn estará aqui em breve, e quando ela terminar com você, estará pronto para falar. Você verá, ela tem um talento para persuadir até os mais teimosos."

Ele se endireita, satisfeito consigo mesmo, e sai da cela, me deixando sozinho na escuridão. O silêncio cai novamente, mas desta vez, é diferente. A imagem de Evelyn Ashcroft permanece em minha mente, uma figura desconhecida, mas já intrigante. Pela primeira vez em muito tempo, sinto uma faísca de curiosidade tingida de suspeita. Kane é um tolo, mas talvez ele tenha introduzido um elemento nesta equação que pode mudar tudo.

Fico imóvel, pensando no que isso pode significar. Uma nova ameaça, ou uma oportunidade? Estou em alerta, pronto para o que vier, porque não importa quem ela seja ou o que ela pense que pode fazer, eu continuo sendo Vykhor Kael’seth. E ninguém, nem mesmo Evelyn Ashcroft, vai me quebrar.

Divirto-me imaginando-a, só para passar o tempo, para manter minha raiva sob controle. Se eu confiar nas palavras venenosas de Kane, ela não pode ser tão impressionante. Imagino-a pequena, encolhida, talvez de ombros largos, com aquele andar rígido militar que trai uma vida passada obedecendo sem questionar. Seu rosto, imagino severo, sem traço de suavidade ou feminilidade, marcado pela austeridade. Cabelos opacos, provavelmente presos em um coque rígido, como se estivesse tentando esconder qualquer traço de humanidade atrás de uma fachada rígida.

Evelyn Ashcroft... Um nome muito elegante para uma mulher que imagino tão insignificante quanto Kane. O pensamento me faz sorrir—um sorriso raro e amargo. Ela deve ter aquele olhar frio e sem emoção, o tipo de pessoa condicionada a obedecer sem nunca questionar a autoridade. O tipo de pessoa que, como Kane, pensa que sabe tudo, mas não entende nada sobre a verdadeira complexidade do universo. Ela provavelmente é tão avançada psicologicamente quanto ele, o que não é um elogio. Vamos apenas dizer que não espero nada particularmente impressionante dela. Apenas mais um humano, perdido em ambições além de seu alcance.

E se ela pensa que pode me quebrar, ficará profundamente desapontada. Ninguém quebra Vykhor Kael’Seth. É sempre o contrário.

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