Piloto

Outra mão se levantou, e a Dra. Naomi Holt contemplou a oferta de seu pai para se aposentar nas Ilhas Jamaicas.

"Sim?" Ela suspirou.

"E sobre os Ômegas e Gammas?"

A turma riu suavemente. Naomi fechou os olhos e cruzou os braços. O auditório estava meio vazio naquela tarde tranquila, e uma brisa cruzada das longas janelas traseiras balançava a tela do projetor. Ela exalou lentamente antes de responder.

"Qual é o seu nome mesmo?"

"Luna-"

"Reformule sua pergunta. Um pouco mais especificamente desta vez."

A morena de 16 anos inflou as bochechas e se mexeu na cadeira. Por que estavam rindo?

"Você não mencionou nada sobre Betas ou Ômegas."

A Professora colocou seu apontador laser como uma ponte entre os dois dedos indicadores. Parecia que ela estava prestes a quebrá-lo ao meio.

"Srta. Luna", ela começou, "Pode repetir o título deste curso para mim, por favor?"

"Desculpe, senhora. Vou prestar atenção." disse Luna, percebendo seu erro. Não valia a pena. Ela não queria que a implacável Dra. Naomi sequer se lembrasse dela, a mesma professora que havia reprovado uma turma inteira por desafiar seu currículo sobre Vampiros.

A Professora tamborilou o apontador na palma da mão esquerda, olhando para sua turma, quase incerta se deveria voltar ao quadro branco.

"O conceito de Ômegas, Betas ou Gammas foi levantado por um cientista sueco que não entendia a estrutura completa dos lobos na natureza. Não falaremos sobre essas coisas nesta sala de aula."

A Professora colocou a mão no bolso do seu terno azul marinho e tirou um celular que estava vibrando há uma hora. Ela aproveitou a pausa para descobrir quem estava ligando. Seus olhos voltaram para a turma e ela bateu o apontador na mesa de ferro oca.

"Segunda-feira. Lobos cinzentos. Lobos terríveis. E Luna, estrutura social completa de todos os canídeos extintos e existentes. Boa tarde."

A Professora saiu da sala com uma hora restante no período, e Luna enterrou o rosto nas mãos.


Um homem que parecia ter pouco mais de vinte anos sentou-se no banco do parque e fechou seu celular flip. Ele não fez nada nos primeiros minutos, mas logo levantou a mão direita para domar uma mecha solta de cabelo.

"Vincent." uma voz sem corpo chamou.

O homem virou-se para olhar a Professora e sorriu. Ele achava que se lembrava bem dela, mas ela estava muito além do que sua mente devota podia imaginar. Ele agradeceu pelos óculos dela, que acentuavam seus grandes e adoráveis olhos castanhos, e pelo vento, que envolvia suas roupas naquele corpo delicado e flexível. Seu terno azul marinho tinha listras brancas que contrastavam com seu longo cabelo preto que flutuava com a brisa. O homem pensou em feitiços que poderiam colocar o tempo em uma garrafa para encapsular momentos como aquele.

"Naomi. Por favor." ele começou e gesticulou para o lugar vazio no banco.

"Por que você está aqui?" ela cortou.

O homem não perdeu o sorriso. Ele olhou para frente e relaxou no banco que rangia. Ele falou com um tom sombrio, e seus olhos pareciam pesados e cansados.

"Vou me casar.", ele forçou a dizer.

Naomi não disse nada, apenas se moveu para encontrar seu lugar no banco duro.

"É neste sábado", ele continuou.

"Parabéns." disse Naomi.

As palavras cortaram fundo em um poço negro que repousava na alma do homem. Eles ficaram em mais silêncio. Estudantes saíam de suas salas de aula e às vezes iam direto para a cafeteria ao ar livre, às vezes para as escadas que levavam para fora do departamento de Artes. A conversa e os passos eram abafados pelo vento, que parecia estar aumentando.

"Mas o que isso tem a ver comigo?" perguntou Naomi.

"Você sabe." o homem respondeu sem hesitar.

"Suponha que eu não saiba nada sobre você. E explique.", Naomi retrucou.

O homem preparou sua respiração.

"Naomi-"

"Continue. Me diga como foi absolutamente torturante para você pedir." ela zombou. Ela odiava isso. Odiava como o maxilar dele parecia esculpido daquele ângulo. Como os cachos dele balançavam ao vento. Como as mangas da camisa dele se esticavam para conter aqueles poderosos tríceps. Ela os imaginava, lembrava de como eles pareciam, de como se sentiam em corpos nus...

"Não foi fácil. Mas eu não estaria aqui a menos que fosse absolutamente necessário. Aurora tem estado, ela saiu de casa, ninguém sabe por quê. Já faz 2 anos. Se ela não voltar até a próxima lua cheia, o pai vai excomungá-la da matilha. Eu nem sei se ela está viva." O homem mexia no relógio em seu pulso esquerdo. Um velho e brilhante Seiko Tank.

"Quanto à cerimônia, a mãe não se importa. Ela diz que, desde que eu esteja feliz", ele continuou.

"Parece que ela teve uma mudança de atitude. Estou chocada. Você sabe o que aconteceu comigo depois de nós?"

"Você me deixou primeiro, Naomi." disse o homem.

"Isso foi porque você nunca planejou me manter em primeiro lugar!" disse Naomi.

Naomi respirou fundo para se acalmar e levantou-se do banco.

"Bem, é todo o tempo que eu tenho. Foi... algo, colocar a conversa em dia, Vin. Mas minha próxima aula está começando.

"O quê?"

Ela olhou desafiadoramente. Não repetiria.

Vincent Moonlight também se levantou e inclinou-se levemente em seu espaço. Ela achou que os olhos dele pareciam mais apagados do que o normal e ele achou que os dela brilhavam demais para uma tarde.

"Não somos pelo menos amigos, Naomi?" ele perguntou.

O som do vento era ensurdecedor, e algumas gotas de chuva começaram a se acumular na calçada de concreto.


Naomi abriu uma pasta marrom e levantou a tampa do laptop. Alguns alunos filtraram-se para dentro do auditório, mas o número não era nem de longe tão grande quanto o da aula anterior. A vista da mesa do instrutor mostrava um pôr do sol alaranjado nas janelas traseiras, e o som das gotas pesadas de chuva batendo nos vidros. Antes que pudesse se dirigir à turma, uma mulher vestindo uma blusa preta e óculos de aro de chifre entrou.

"Naomi, o que foi aquilo?!" ela exigiu.

"Charlotte. Do que você está falando?" perguntou Naomi.

Charlotte a puxou pelos ombros.

"Aquela criatura magnífica." sussurrou Charlotte.

"Hã?"

Outra mulher apareceu ao lado de Naomi. Ela era mais baixa que as duas, mas sua presença comandava um certo respeito.

"Por mais que eu odeie concordar com a Charlotte-" ela começou, "Seu visitante do parque, idiota."

"Ah." comentou Naomi.

"Ah?" disse Charlotte, parecendo ofendida. Ela olhou para a mulher baixa, Jennifer. Ah?

"Garota, isso não é um ah. Aquele homem é um-" começou Jennifer.

"Sim, um sim absoluto, meninas. Deus, eu gritaria isso nos ouvidos dele-" terminou Charlotte.

"Vamos nos acalmar." zombou Naomi.

"O que ele queria?" perguntou Jennifer.

"Nada. Bem, não nada. Aparentemente, ele estava aqui para um programa de pós-graduação em robótica. E nós nem temos um departamento de mecatrônica. Acho que ele estava apenas confuso." disse Naomi enquanto ligava o computador.

As duas balançaram a cabeça.

"Você não pode ser tão ingênua, Charlotte." começou Jennifer.

"Eu odeio dizer isso, mas você realmente não percebeu que ele estava flertando com você?" perguntou Charlotte.

Naomi balançou a cabeça.

"Vamos lá! Deveria ter sido comigo. Me diga, por favor, me diga que você pelo menos tem o número dele. Ele acabou de sair em um Huracan."

"Talvez." respondeu Naomi timidamente. "Vocês sabem que eu tenho uma aula, tipo agora?"

Charlotte bateu as palmas das mãos nas bochechas de Naomi.

"Escute-me agora, Naomi. Nunca fui tão séria sobre nada até agora. Você liga para aquele número. Seja o que for, você liga para aquele homem." pregou Charlotte.

"Agora, agora. Tenho certeza de que ela pode tomar suas próprias decisões." Jennifer interferiu, separando as duas.

"A vida é passageira, Naomi. Pelo menos faça isso por mim!" Charlotte estava quase gritando enquanto Jennifer a conduzia para fora do auditório. "Nos vemos mais tarde" ela disse.

Naomi suspirou longamente e se preparou para se dirigir à sua turma perplexa. Ela manteve as palavras de Charlotte no fundo da mente. A vida é passageira...

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