09
– Arran. O mar parece meio... grande.
– Essa foi uma ótima definição. – ele mordeu o lábio e provavelmente riu também. Não me deixei abalar pelo rosto sexy dele:
– Obrigada. Ah... Ele também é assustador.
– Ele só é assustador de longe, de perto ele é a coisa mais doce do mundo. – Olhei para ele com descrença. Como ele podia achar doce o mar que afundou tantos navios há tantos anos? O mesmo mar que engoliu homens inteiros em suas profundezas, que destruiu navios inteiros de viajantes espanhóis, portugueses e ingleses? Eu tinha medo do mar por causa das histórias. Pela convivência. Por todo o seu esplendor. E por toda a intimidade que tínhamos. Cresci com o cheiro salgado do mar no nariz. Era e sempre tinha sido minha vida, vê-lo de longe, seu vento dobrando as páginas de um livro para mim desde que eu tinha 9 anos. E não importa se era aqui no Rio ou do outro lado do mundo. O mar nunca seria doce, sempre teria a doçura salgada de sangue, tristeza, esperança e minha infância. Refleti por alguns segundos e acabei sorrindo com a afirmação dele, não era culpa dele se eu estava condenada ao medo do mar e esses pensamentos exagerados e dramáticos, ele tinha sorte de poder enfrentá-lo. Arrisquei até uma piadinha:
– Não doce, o mar é salgado. – O rosto dele se abriu em um meio sorriso.
– Eu poderia te ensinar.
– Esquece, você não iria querer se envergonhar com uma garota com boia no braço no meio do mar doce...
– Você não me conhece. Você não sabe do que sou capaz...
– Sério? Você tem razão. Você é um estranho, eu não deveria falar com você. – Olhei assustada, colocando a mão no coração. – Você poderia ser um psicopata!
– Não foi isso que eu quis dizer. Ei! Onde você vai? – Levantei-me da cadeira, pegando minhas bolsas extras, cheias de lixo, e caminhei cambaleando até uma lixeira perto de onde eu estava sentada. Eu tinha dado uma chance ao garoto do mar para me entreter, tinha sido divertido, claro. Mas não sei... Ele me deixou confusa e senti esse desejo repentino de deixá-lo com seus pensamentos confusos. Vi algumas crianças jogando vôlei no canto. Seus olhares convergiram na minha direção. Um deles, mais corajoso, me deu um ‘oi’ alto, forte e animado, me dando um sorriso gigantesco. Ignorei ele e seus amigos riram. Voltei para minha cadeira... Onde Igor ainda estava sentado, observando meus movimentos. Dobrei minha cadeira, que graças a Deus dobrava facilmente e era bem pequena, então delicadamente, com toda a intimidade do mundo, empurrei Igor da outra cadeira. Ele caiu na areia e me olhou indignado. Sorri ironicamente, dobrando a outra cadeira e colocando as duas cadeiras na bolsa maior. Peguei minha bolsa de praia e a sacola e comecei a caminhar, deixando um garoto e uma prancha para trás.
– Ei, espera. Eu não sabia que você levaria a sério essa coisa de estranho. – ele me alcançou com passos largos. A prancha pendurada no braço dele, perguntei se não seria pesada para ele, mas vendo os braços dele... Vi que talvez fosse leve. – Você é meio bipolar?
– Na verdade... Sou.
– Bipolaridade é algo super sexy, acredite. – Virei para ele, meio rindo.
– Ok, eu vou ficar com você. – Senti meu rosto corar por causa da minha cara de poker. Mas foi divertido testar isso. Vi que quando disse isso ele deu alguns passos à frente, se aproximando. – E você vai embora?
– É uma troca? Um beijo seu e eu tenho que ir embora? – O dedo dele levantou, removendo uma mecha de cabelo do meu pescoço. Eu apenas fiquei parada. Sem saber o que fazer. Tudo o que eu conseguia pensar era que ele estava perto... Perto demais. Esperei que ele me beijasse. Eu quase tinha esquecido como era sentir os lábios de alguém nos meus. Ele me surpreendeu, mais uma vez. – Se for assim, eu recuso. Não vou conseguir cumprir esse acordo.
– Então você sempre cumpre promessas?
– Só quando as pessoas valem a pena.
– Ninguém vale a pena. – Removi a mão dele da base do meu rosto e sorri desapontada.
– Você acha isso?
– Eu sei disso.
– Para uma garota nova, você é um pouco amarga. – É o que dizem. Queria dizer, mas fiquei quieta. Preferindo outra resposta.
– Você nem sabe minha idade. – Disse, dando alguns passos para trás. Na defensiva. Parecia que ele podia me ler...
– Tem 15 anos, se chama Malu e gosta de Mc Lanche Feliz. Eu sei onde você dorme!
– Como? – Cruzei os braços desafiadoramente.
– Bem, você tem um quarto individual no hotel, enquanto seu pai e uma mulher ficam cerca de 4 andares acima. Sua cama deve ser um pouco parecida com a minha, colchão macio, fronha azul...
– C-como você sabe disso?
– Seu quarto de hotel é ao lado do meu. Você é o número 11 e eu sou o número 12.
– Como você sabe disso... também? – Arregalei os olhos, ainda mais assustada.
– Eu vi você fazendo reservas com seu pai.
– Ah! – Isso fazia mais sentido.
– Então, infelizmente para você, você não vai se livrar de mim tão cedo. Até mais, Maria de Lourdes. – Então ele simplesmente me deixou ali e caminhou em direção ao mar. Fiquei ali, completamente de boca aberta enquanto ele se afastava. Completamente confusa e irritada por ele ter dito meu nome em voz alta. Um pouco assustada, mas surpresa. Se era de um jeito bom ou ruim... Eu não conseguia decidir. Ele olhou para trás uma vez e eu pude ver seu sorriso torto. Balancei a cabeça, caminhando para o meu hotel. Que cara estranho! Talvez ele seja mesmo um psicopata. Ou não... Talvez ele fosse apenas um pouco idiota por falar comigo e querer repetir a dose.
Caminhando pelo saguão do hotel, acabei encontrando a noiva do meu pai, Cristina. Ela era fisicamente atraente, com seu cabelo curto e vermelho e corpo ligeiramente rechonchudo. Ela era cerca de 10 anos mais nova que meu pai e tinha estudado Gastronomia na faculdade, pois acreditava que isso a ajudaria a encontrar um bom marido e alcançar a única coisa que realmente queria ser, uma dona de casa. Não que isso fosse ruim, mas o fato de ela procurar um homem casado para construir sua própria família destruindo outra me fazia desprezá-la. Ela tinha o ar de uma pessoa legal, mas nos odiávamos. Talvez ela achasse que o fato de seu futuro marido ter filhos e um casamento antigo estava arruinando seu sonho de uma família feliz. E eu achava que ela estava roubando o pouco que me restava do meu pai.
– Onde você estava? – ela disse arrogantemente.
– Na praia. Dã. – Levantei minhas cadeiras e minha bolsa e ela revirou os olhos.
– Seu pai está procurando por você.
























































































