O despertar:
Umara:
Deitada de bruços, em almofadas finas e macias. Sem dúvida, o paraíso é um lugar confortável, silencioso e pacífico... Suspiro feliz. Posso ouvir ao longe o borbulhar da água caindo, de lá também vem o canto de um pássaro. Sorrio, sem dúvida cheguei ao grande Oasis celestial, onde doze rios cristalinos fluem, onde as árvores dão frutos todos os meses do ano, onde nunca mais passarei fome... ou sede. Onde não terei memória de...
Abro os olhos bruscamente e levanto a cabeça. Posso me lembrar de tudo. A longa peregrinação, a fome, a sede, o mercado de escravos, o calor intenso, a queimadura do chicote nas minhas costas... os gritos de misericórdia do mercador e depois nada...
Gemo impotente e me encolho em posição fetal, deitada sobre o lado direito. Diante de mim, há uma parede branca imaculada. Exalo frustrada. Não cheguei ao Paraíso... ainda estou presa no plano terrestre, e estou aqui... O Onisciente saberá onde.
— Vejo que você acordou. — Uma voz feminina suave sussurra atrás de mim. — Sua Majestade ficará satisfeita...
Reviro os olhos.
— Seria bom se você tentasse se levantar o mais rápido possível. Você dormiu por muito tempo. Primeiro, perdeu os sentidos por desidratação, e depois nossos curandeiros tiveram que mantê-la em um sono profundo para que suas feridas cicatrizassem mais rápido.
— Me deixe em paz. Teria sido preferível se tivessem me deixado morrer. Agora eu estaria reunida com meus ancestrais. — Rosno.
A mulher suspira atrás de mim.
— Não era a hora da morte te reclamar. Você estava fraca, sim, mas nada que um bom descanso e líquidos não pudessem curar.
Penso por um segundo e consigo entender a verdade de suas palavras. Mas ainda estou com raiva. Aos poucos, me viro para observar minha interlocutora e fico surpresa. Tudo ao meu redor parece emitir um brilho dourado ofuscante. Aperto os olhos para que o brilho não me incomode tanto. Pelo que sei, isso é um símbolo de riqueza e hierarquia entre os Kurani, quanto mais alto e poderoso o posto do nobre, mais cheio de ouro e outras pedras preciosas será seu lar. Pelo aspecto deste lugar, eu diria que um príncipe me comprou. Mas isso não faz sentido, a última coisa que lembro é de cair de cara na lama no mercado de escravos.
Meus olhos repousam sobre minha interlocutora. A mulher veste um vestido de cores vibrantes, longo e estreito nas pernas, usa meias brancas e sapatos de madeira que certamente são muito desconfortáveis. Meus olhos sobem e vejo um rosto coberto de maquiagem branca espessa, olhos tão inclinados que parecem semicerrados, um nariz pequeno e lábios finos pintados de um vermelho profundo. Minha mandíbula cai de espanto. Nunca tinha visto uma pessoa assim. Com tudo e sapatos, a mulher é minúscula.
Lábios carmesim me oferecem um sorriso.
— A primeira vez que alguém me vê, sempre tenho a mesma reação.
Fecho a boca rapidamente e limpo a garganta.
— Não se envergonhe. — continua a pequena mulher docemente.
— Estou convencida de que você descobrirá maravilhas maiores aqui no Palácio — diz ela, rindo.
— Sou Lady Citiê. Venho de uma terra distante, mas isso não importa agora. Vamos, venha. Precisamos te banhar e preparar para sua apresentação esta noite. — Ela bate palmas algumas vezes e uma dúzia de garotas aparecem do nada, me arrastando para fora da cama e para uma banheira transbordando de água morna.
— Senhor, a sétima lua despertou. — Lady Citiê sussurra de sua almofada, onde estava ajoelhada.
O imperador acena com a cabeça, indicando que ficou satisfeito com a notícia. Ele estende a mão e leva a xícara de chá fumegante aos lábios, tomando um gole.
— Ela estará pronta e esperando por você esta noite, Senhor — continua a dama, abaixando os olhos e inclinando a cabeça.
Um meio sorriso sinistro se espalha pelos lábios grossos e sensuais do homem sentado à sua frente.
Umara:
Fui banhada e esfregada, ensaboada e seca. Enquanto algumas criadas lavavam meu cabelo, outras cortavam minhas unhas. Estou perplexa. As feridas nos meus pulsos e tornozelos desapareceram completamente. Aprendi com as donzelas que estive dormindo por quinze nascimentos e mortes solares. Elas tiveram que me alimentar principalmente com caldos e infusões curativas. É incrível. Não entendo como pude dormir tanto.
Estou de pé agora. Diante de um objeto muito peculiar. É como um lago, que devolve minha imagem, mas não contém água, é duro e frio ao toque. É emoldurado por entalhes brilhantes e pequenas pedras coloridas. As donzelas me dizem que se chama "revelador" ou "prata" e que seu propósito é mostrar o reflexo da pessoa à sua frente.
Estou irreconhecível. As garotas espalharam substâncias perfumadas por todo o meu cabelo e corpo. Elas trançaram e adornaram minha cabeça com pequenas contas brancas em um penteado intricado, aplicaram preto sobre meus cílios e pintaram meus olhos para parecerem maiores e mais exóticos, aplicaram um tom rosa claro nos meus lábios, cobriram meu corpo com tecidos leves e totalmente transparentes.
E olhando para meu reflexo, sou capaz de descobrir que tanto embelezamento só pode significar uma coisa: fui tomada como concubina.



































