2. Eu vou cuidar disso.
༅➹⁂ Brook ⁀➷♞
—Bom dia, mãe —cumprimento ao entrar na cozinha. Como sempre, ela está preparando o café da manhã bem cedo. Embora eu já viva nesta casa há anos, que construí perto da principal para ter mais privacidade, ela nunca deixa de seguir sua rotina de cozinhar para mim todos os dias. O aroma da manteiga derretendo na frigideira e do café recém-feito envolve o espaço com uma familiaridade acolhedora.
—Bom dia, filho —ela me abraça e seu perfume de lavanda é reconfortante, me lembra quando eu era criança—. Como você dormiu?
—Descansei, que é o importante —suspiro. Há alguns anos, dormir bem se tornou um desafio.
—Acho que você trabalha demais, Brook —lamenta—. Deveria tirar umas férias.
—Impossível, mãe —nego com a cabeça—. Tenho reuniões importantes este mês e algumas vendas das quais preciso cuidar pessoalmente.
—Você poderia delegar mais responsabilidades ao Spencer —sugere, deslizando um prato fumegante na minha frente—. Ele é muito capaz.
Spencer é meu capataz e meu braço direito no rancho. Um homem de confiança, sempre atento aos detalhes que outros poderiam ignorar.
—Você sabe que eu gosto de estar a par de tudo —lembro-a, enquanto corto um pedaço de pão e passo geleia.
—Eu sei —suspira resignada—. Daryl me comentou que quer levar o pequeno Bruno à praia no verão. Por que você não os acompanha? —propõe—. Você tem tempo para preparar tudo.
Daryl tem sido minha melhor amiga desde o colégio. No ensino médio, começou a namorar meu irmão gêmeo, Bruno. Ela ficou grávida, mas perdeu o bebê. Foi um golpe duro para todos. Anos depois, conseguiram conceber novamente e, para celebrar a notícia, Bruno decidiu fazer paraquedismo. Ele era intrépido, alegre, extrovertido; completamente oposto a mim. Mas o salto não saiu como deveria: seu paraquedas falhou e...
Desde então, Daryl vive aqui. Os primeiros anos de vida de seu filho foram difíceis. Ela estava mergulhada na depressão, então minha mãe e eu cuidamos do pequeno Bruno. Com terapia e tempo, Daryl conseguiu se recuperar. Agora está mais presente na vida de seu filho, que se tornou minha adoração. Ela também retomou os negócios do meu irmão, o que a ajudou a se manter ocupada.
—Brook —chama minha mãe, tirando-me dos meus pensamentos.
—Sim?
—O que você acha da minha sugestão?
—Vou pensar, mãe —digo com a intenção de que ela pare de insistir—. Sente-se, faça-me companhia —aponto para a cadeira à minha frente—. Como você está?
Ela toma um gole de seu café e respira fundo.
—Estou bem —faz uma pausa, pensativa—. Embora haja dias em que eu acordo irritada com seu irmão. Por que ele fez essa besteira de pular de um avião? —levanta a voz com frustração.
—Você sabe que Bruno adorava esse tipo de esportes radicais.
—Preferiria mil vezes que ele comemorasse bebendo, dançando ou de alguma outra maneira —desabafa com a frustração ainda presente na voz.
A morte do meu irmão foi a coisa mais difícil que enfrentamos como família. Uma fase escura e complicada. Minha mãe e eu tentávamos nos manter fortes, principalmente por Daryl, cuja gravidez era de alto risco.
Tomo a mão da minha mãe e deposito um beijo em sua pele quente.
—Te amo, mãe.
—E eu a você, filho —ela exala pesadamente e se levanta—. Vou preparar algumas tortas de maçã para a igreja.
—Peça a um dos rapazes para te levar, por favor.
—Claro, pai, farei isso —ela ri, deixa um beijo na minha bochecha e vai embora.
Termino o café da manhã, recolho os pratos e me dirijo ao estábulo. Um dos rapazes já tem meu cavalo pronto, então saio para dar uma volta pelas cocheiras.
—Bom dia —me cumprimenta Spencer ao me ver.
—Bom dia —respondo enquanto ajusto as rédeas—. Tudo em ordem?
—Claro —ele assente—. Em algumas horas chegará o cavalo da filha do prefeito. Ele o comprou na cidade e não conseguiram domá-lo.
—Isso é o que acontece quando compram cavalos em outro lugar, quando aqui temos os melhores —estalo a língua e Spencer solta uma gargalhada—. Só por isso deveríamos cobrar o dobro —rio e ele assente divertido.
—Brook, tem algo que eu gostaria de comentar com você —sua expressão muda ligeiramente, tornando-se mais séria.
—O que foi? —me endireito na sela.
—Ontem à noite ouvi muito barulho perto dos apartamentos dos trabalhadores —ele limpa a garganta, visivelmente desconfortável.
—Acho que é algo normal, estão perto de um caminho por onde passam agentes durante a madrugada —menciono sem entender sua preocupação.
Os apartamentos estão um pouco afastados das casas, mas perto das cocheiras. Alguns trabalhadores fazem vigília no rancho durante a noite. Vivemos em uma cidade tranquila, mas sempre existe a possibilidade de que alguém queira se aproveitar, e prefiro prevenir.
—Você deveria dar uma volta por lá, acredite em mim —ele insiste, e posso notar sua inquietação, o que é raro nele.
—Tudo bem, vou para lá —assinto.
Tomo o caminho e passo pelos apartamentos. Os trabalhadores me cumprimentam ao me ver, todos já se dirigindo aos seus respectivos postos. Percorro o lugar sem notar nada fora do comum, mas algo dentro de mim me mantém alerta.
Cruzo o caminho e verifico a área desértica ao redor. A alguns metros há um galpão abandonado. Embora eu soubesse de sua existência, parece que houve movimento no local.
O interior está em completo silêncio. Estou prestes a dar meia-volta para sair quando algo chama minha atenção e desço do cavalo.
A madeira range sob minha bota quando me aproximo. No chão, escondida sob caixas e feno, uma enorme porta de madeira jaz quase imperceptível. Me inclino, passando a mão por sua superfície, e percebo que tem vários cadeados novos.
—Para que têm usado este lugar? —me pergunto em voz alta, cerrando a mandíbula.
—É um túnel —ouço atrás de mim, cortando o silêncio.
Me levanto imediatamente, me viro alerta, e me deparo com uma mulher.
—O quê? —questiono.
Ela avança alguns passos com os olhos fixos na porta oculta.
—Pensei que você estava ciente —aponta.
—Ciente de quê?
—Certos dias, o túnel é utilizado —explica—. Não sei para quê, mas imagino que não seja nada bom.
Observo novamente os cadeados e a forma como a entrada está cuidadosamente disfarçada sob a pastagem e as caixas. Tudo naquela cena me parece suspeito.
—E por que eu deveria saber disso? —indago, com um tom mais duro do que pretendia.
Ela me encara com uma expressão indecifrável.
—Este é o seu rancho, não é?
—Na verdade, este lugar fica fora da minha propriedade —cruzo os braços sobre o abdômen—. Como você se chama? —pergunto, olhando-a atentamente. Nunca a tinha visto antes.
—Sou Soraya, amiga do Spencer, cheguei há algumas semanas —se apresenta e lembro que ele me pediu trabalho para ela, aparentemente tem experiência com cavalos, é uma garota imponente e parece ser de atitude—. Então pertence ao outro rancho? —aponta para uma casa ao longe, voltando ao assunto do túnel.
—Não, acho que é da cidade, embora não possa garantir —torço a boca, inquieto com essa situação—. Alguém mais sabe disso?
—Não creio —nega com a cabeça—. Este lugar passa despercebido, mas Spencer e eu percebemos porque não costumamos dormir cedo e às vezes saímos para caminhar.
Seu tom é contido, mas desconfiado.
—Bem, em teoria, isso não deveria me afetar —declaro, mas uma sensação de desconforto se instala no meu peito—. Como te disse, este lugar não pertence ao meu rancho.
—Eu não estaria tão segura, senhor Prescott —insiste com voz firme—. O rancho mais próximo a este galpão abandonado é o seu, e se realmente for usado para algo ilegal, o primeiro investigado será você.
Seu argumento é sólido, então assinto levemente.
—Diga ao Spencer para não comentar com mais ninguém —peço—. Vou cuidar disso.
Subo no cavalo e volto para casa, ponderando minhas opções. O xerife está descartado. Não confio nele e também não quero colocar o rancho em uma situação delicada antes de saber exatamente o que está acontecendo.
Pego o telefone e disco o número de Nathan Blake, um detetive do FBI que conheço e que tenho certeza poderá me orientar.
—Blake —responde.
—Como vai, Nathan? —cumprimento—. Aqui é Brook Prescott.
—Brook, como você está? Tem algo para mim?
—Eh... sim, mas não é exatamente um cavalo —suspiro, a tensão é um fio na minha voz.
—O que está acontecendo?
—Acabei de descobrir o que parece ser um túnel perto das minhas terras —informo—. Não tenho ideia para que é usado, mas estando perto da fronteira, duvido muito que seja para algo bom.
O silêncio de Nathan se estende alguns segundos além do habitual.
—Você sabe se está sendo utilizado? —indaga finalmente com um tom mais profissional.
—Um dos meus funcionários ouviu movimentos, mas não sei mais nada. Obviamente, não quero que isso afete meu rancho.
—Entendo —assegura—. Você pode confiar no xerife da cidade?
—Não sei. Ele não tem uma boa reputação.
—Deixe-me consultar alguns especialistas e te retorno a ligação.
—Perfeito, obrigado, Nathan.
—Fez bem em me avisar —afirma, e não é simples cortesia. A gravidade em seu tom me confirma que isso é mais sério do que quero admitir—. Isso pode ser uma grande investigação se for conduzida corretamente. Por favor, mantenha a maior discrição possível.
—Claro.
—Te ligo depois.
Desligo a chamada, mas a inquietação continua ali, presa no meu estômago.
Quem poderia estar relacionado com o túnel? Será alguém que trabalha na minha fazenda?
Não posso me deter muito nisso. O cavalo da filha do prefeito deve estar chegando. Volto para os estábulos, onde me encontro com Spencer.
—Encontrou alguma coisa? —indaga.
—Sim.
—E?
—Vou cuidar disso —o tranquilizo, sem entrar em detalhes—. A propósito, conheci sua namorada, Soraya.
—Ela não é minha namorada —resmunga—. Por mais que eu tenha insistido.
—Ela é muito bonita, mas parece ser uma garota de personalidade forte —levanto uma sobrancelha em modo de advertência.
—Ela é —bufa—. Por isso não me dá atenção.
Nesse momento, uma caminhonete para e a filha do prefeito desce com um ar presunçoso, sempre olhando todos de cima.
—Olá, Brook.
—Reychell —cumprimento, mantendo a expressão neutra.
Não posso negar que ela é muito atraente, mas sua atitude não me agrada nem um pouco.
—Espero que você possa fazer algo com meu cavalo. Nunca imaginei que seria tão difícil de domar, nem mesmo meu capataz conseguiu —faz um biquinho, franzindo os lábios.
Descem o cavalo e eu tomo um momento para admirá-lo. É um exemplar magnífico, preto com algumas manchas brancas. Está inquieto e sua respiração tem um ritmo agitado.
Me aproximo e coloco minha mão sobre seu rosto, para transmitir minha calma e sua inquietação vai diminuindo aos poucos.
Levo alguns minutos para montá-lo, mas ao fazê-lo confirmo o que já suspeitava: é um cavalo incrível, só precisa de trabalho e de aprender a confiar. Desmonto e caminho até Reychell.
—Recomendo que o deixe aqui por alguns dias para que ele possa estar pronto para você.
—Sabia que você conseguiria —seus lábios se curvam em um sorriso confiante—. Posso vir vê-lo durante os dias que ele estiver aqui?
—Claro.
—Obrigada, Brook, nos vemos por aí —se despede e volta para sua caminhonete.
Mal desaparece da minha vista quando ouço a voz divertida de Spencer atrás de mim.
—Ela só quer vir te ver, não ao cavalo.
—Então vamos nos apressar para que ele esteja pronto —reviro os olhos e Spencer solta uma gargalhada.
—Você precisa se apaixonar, principalmente para se livrar desse mau humor que carrega sempre.
—Duvido muito que essa seja a solução —olho para ele com cara feia—. E é melhor você trabalhar, que não preciso de conselhos amorosos do maior mulherengo do Texas —o repreendo e suas gargalhadas ficam ainda mais altas.
Depois que ele se acalma, volta aos seus afazeres e eu continuo com meu trabalho.
